O
zoneamento é um instrumento amplamente utilizado nos planos diretores, onde a cidade
é dividida em áreas de características semelhantes, sobre as quais incidem
diretrizes diferenciadas para o uso e a ocupação do solo, especialmente os parâmetros
urbanísticos (afastamentos, taxa de permeabilidade, gabarito, entre outros).
O
zoneamento foi utilizado pela primeira vez na Alemanha, mas foi nos Estados
Unidos que ele ganhou força, a partir do início do século XX.
Alguns
de seus principais objetivos são:
- Controle da expansão urbana;
- Controle do adensamento;
- Proteção de áreas inadequadas à ocupação urbana (áreas de risco, áreas de proteção ambiental, etc.);
- Minimização dos conflitos entre usos e atividades;
- Controle do tráfego;
- Manutenção dos valores das propriedades.
Quanto
a este último objetivo, cabem algumas ponderações. Apesar de, geralmente, essa
intenção não estar explícita, parece haver um consenso entre vários autores de
que ela foi a razão inicial para a utilização do zoneamento. No início, a
motivação principal para a sua adoção era a de evitar que determinados tipos de
usos do solo fossem instalados em determinadas áreas da cidade. Não por acaso,
esses usos eram, na maioria das vezes, aqueles relacionados às classes mais
baixas (tais como vilas, cortiços, habitação popular, comércios de pequeno
porte, etc.). Por conta disso, o caráter excludente do zoneamento é alvo de
muitas críticas, como veremos mais adiante.
Como funciona?
O
zoneamento propõe alcançar esses objetivos através do controle de dois
elementos principais: o uso e o porte (ou tamanho) dos lotes e das edificações.
Através disso, supõe-se que o resultado final alcançado através das ações
individuais esteja de acordo com os objetivos do município, que incluem
proporcionalidade entre a ocupação e a infraestrutura, necessidade de proteção
de áreas frágeis ou de interesse cultural, harmonia do ponto de vista
volumétrico e da paisagem.
Combinações diferentes de parâmetros, gerando, por sua
vez, espaços urbanos também diferentes. Fonte: <http://urbanidades.arq.br/2007/11/zoneamento-e-planos-diretores/>.
A forma
típica de apresentação de um zoneamento é um mapa contendo as zonas,
representadas por cores e siglas, complementado por uma parte textual em que as
zonas são descritas e seus parâmetros urbanísticos são definidos, normalmente
em forma de tabela.
Exemplo de mapa de zoneamento e tabela de índices
urbanísticos aplicados às zonas definidas pelo Plano Diretor de Florianópolis
(1997). Fonte: IPUF.
Minimização
dos conflitos de usos do solo
Apesar de a mistura de
usos ser amplamente reconhecida como interessante para a cidade, e até mesmo
essencial, existem atividades que podem causar incômodos e, por isso, devem ter
sua localização controlada.
Para isso, o plano
diretor pode usar vários mecanismos:
- Limitações por zonas;
- Regulação paramétrica;
- Limitações pelo sistema viário;
Na limitação por zonas, a mais comum de
todas, os usos e atividades são divididos em categorias (residencial,
comercial, industrial, agrícola, etc., e suas subcategorias) e cada zona possui
diretrizes quanto à possibilidade ou não de abrigar cada uma delas. Assim, por
exemplo, o zoneamento pode determinar que uma porção da cidade pode abrigar
usos residenciais e comerciais de pequeno porte (padarias, mercearias, etc.),
mas não pode abrigar usos comerciais de grande porte nem usos industriais.
Na regulação paramétrica, a permissão ou proibição para que uma
atividade se instale em um determinado local é definida com base em parâmetros
de incomodidade (por ex. nível máximo de ruído em decibéis). Sua aplicação no
Brasil, entretanto, parece ser problemática, não apenas por questões de
recursos e infraestrutura, mas também pela falta de transparência que pode
trazer (afinal de contas, nem todo mundo dispõe de um decibelímetro para saber
se o bar ao lado da sua casa está de acordo com a legislação).
As limitações pelo sistema viário também classificam os usos e
atividades em categorias, e definem, para estas, níveis de incomodidade. A
seguir, é aplicada a seguinte lógica:
- Vias mais arteriais são mais tolerantes à incomodidade;
- Vias mais locais são mais intolerantes à incomodidade.
Dessa forma,
incentiva-se o uso misto em todas as zonas, e ao mesmo tempo é possível evitar
que usos muito incompatíveis instalem-se lado a lado, com um bom nível de
resolução se comparado ao das zonas.
Outra vantagem é que
isso permite que as zonas adotadas pelo plano diretor sejam maiores, tornando o
esquema geral mais fácil de entender.
Exemplo de restrições à incomodidade aplicados ao sistema
viário.
Fonte: <http://urbanidades.arq.br/2007/11/zoneamento-e-planos-diretores/>.
Controle
da intensidade de ocupação
Com relação ao porte da
edificação, este é controlado através de índices que estabelecem, por exemplo:
- O número máximo de pavimentos e/ou a altura total da edificação;
- O Coeficiente de Aproveitamento máximo do lote (CA), que representa a área máxima possível de ser construída dividida pela área do lote;
- A taxa de ocupação máxima permitida para o lote;
- Os afastamentos frontal, laterais e de fundos;
- O tamanho mínimo do lote.
Exemplo de parâmetros urbanísticos de controle da
ocupação.
Fonte: <http://urbanidades.arq.br/2007/11/zoneamento-e-planos-diretores/>.
Críticas
O zoneamento vem sofrendo muitas
críticas. A primeira delas refere-se à rigidez do instrumento, visto que a
permissão de uso, por parte do Poder Público, acontece na base do “ou tudo ou
nada”. Em outras palavras, a Prefeitura consulta a tabela e, com base nela,
permite a construção da edificação, tal como está no projeto, ou nega
totalmente. Não existe meio-termo.
Dessa forma, em muitos casos acontecia
uma de duas situações: ou a comunidade ficava à mercê do empreendimento,
recebendo todas as consequências da sua aceitação, sem nenhuma condição, ou o
empreendedor tinha seu projeto totalmente negado sem possibilidade de adaptação
ou ajuste, às vezes até mesmo acarretando numa subutilização do território
(JUERGENSMEYER; ROBERT, 2003).
A outra crítica ao zoneamento
tradicional é o fato dele ser, em muitos casos, excludente, na medida em que
estabelece zonas nas quais a ocupação tende a ser composta apenas por grupos
homogêneos, principalmente das classes mais altas (JUERGENSMEYER; ROBERT, 2003;
SOUZA, 2003). Entretanto, o inverso também acontece, quando são criadas grandes
zonas destinadas às camadas mais pobres (normalmente seguindo a ocupação já
consolidada) e criando verdadeiros guetos.
Para evitar essas desvantagens do
zoneamento, algumas variações foram criadas. Entre elas está a própria
regulação paramétrica, citada acima, a criação das Zonas Especiais de Interesse
Social (ZEIS), a vinculação das normas de uso e ocupação do solo ao sistema
viário (também citada acima), o Estudo de Impacto de Vizinhança e, em outros
países, dispositivos para conferir flexibilidade, tais como as Planned Unit
Developments, Variance, Floating Zones, etc (KELLY; BECKER, 2000 e JUERGENSMEYER;
ROBERT, 2003).
Outra providência importante é apoiar
o plano diretor não apenas no zoneamento, mas também nas ações e estratégias a
serem promovidas para alcançar os objetivos desejados.
Apesar de todas essas críticas, é
importante não perder de vista que o zoneamento é um dos instrumentos
essenciais para o planejamento urbano de forma geral e para os planos
diretores em particular.
Referências
JACOBS, Jane. Morte e vida de grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
JUERGENSMEYER, Julian Conrad; ROBERT, Thomas. Land use planning and development regulation law. St. Paul: Thomson West, 2003.
KELLY, Eric; BECKER, Barbara. Community planning: an introduction to the comprehensive plan. Washington: Island Press, 2000.
SOUZA, Marcelo Lopes. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.
URBANIDADES. Zoneamento e Planos Diretores. 26 de novembro 2007. Disponível em: <
http://urbanidades.arq.br/2007/11/zoneamento-e-planos-diretores/>. Acesso em: 20 jun. 2016.
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