domingo, 24 de abril de 2016

O exercício crítico do planejamento espacial

Em um processo de análise urbana com a finalidade de entender suas necessidades e, através dessas, propor e planejar ações de diversas naturezas, é recorrente a exigência em delimitar um espaço para a realização do exame e atuação já ditas.  Para tal, é frequente a admissão do espaço político e administrativamente determinado, o qual é, com a mesma frequência, percebido enquanto um procedimento justo e eficiente para a realização das deliberações voltadas ao espaço urbano e as diversas relações que neste se estabelecem.

No entanto, paralelamente, a tradição metodológica (pelo menos aquela sempre disseminada nos cursos de urbanismo) de compreender a conformação do espaço urbano é colidida com outra que, por sua vez, não tem sua estrutura em bases legais ou políticas. Essa segunda possibilidade de método ordena o espaço a ser estudado perante suas intrinsidades de ordem física ou material: uma serra, um rio, uma rodovia ou a associação desses e demais elementos presentes no espaço em questão.

De imediato, essa outra possibilidade pode ter um eco brevemente ordinário, mas ao lançar todos os “por ques” à sua utilização e efetividade é possível perceber que a resposta, absoluta e simples, carrega em si todas as complexidades do espaço observado. Essas particularidades em muitos casos estão além (ou também aquém) do espaço determinado pela organização administrativa do município.

Então, por que basear a análise nesse segundo procedimento que observa as qualidades físicas da região, e não proceder de acordo com a determinação política do espaço? Simplesmente pelo fato de as condições físicas exercerem uma atuação na vida urbana e nos seus fluxos, estabelecendo-os, interrompendo-os e conduzindo-os, enquanto o espaço definido pela administração legal do município, muitas vezes, se torna abstrato ou obsoleto perante ao acontecimento e exercício da vida no espaço urbano.

Esta forma de entender e proceder sobre o espaço urbano, antes ordinário, exerce agora um sentido ético: a conformação oficial do espaço deixa de ser o cerne do planejamento, mas esta ação passa a ser ordenada pela força e a dinâmica próprias da vida coletiva.

Piet Mondrian, pintor neerlandês atuante no século XX, muito contribuiu para o pensamento atual de arquitetura e urbanismo através de seus textos publicados, os quais expandem e melhor esclarecem a questão aqui levantada. Embora observasse a arquitetura através do desenvolvimento de suas análises sobre a emergência de um novo sistema de conceber a arte – o ainda virtual neoplasticismo -, Mondrian conceitua a produção do espaço para além do domínio estético ou funcional, promovendo o pensamento do campo elevado à ordem ética. Assim, de acordo com o artista, a efetivação dos espaços e da arquitetura deve corresponder com a objetividade da cultura, e estar disposta frente à diversidade de impasses e questões que com ela interagem. Ao considerar as perspectivas da arquitetura e as necessidades da vida humana é estabelecida, então, a participação e conformação entre ambos.

Por fim, amparada pela teoria desenvolvida por Mondrian, e por tantos outros que muito empreenderam esforços nos estudos sobre o espaço, a reflexão aqui posta procura entender o papel do projeto urbano ou, até mesmo, de arquitetura, além de questionar o perigo da existência de uma metodologia ideal e única.

Referências Blibliográficas:

MONDRIAN, Piet. Os grandes bulevares. Amsterdã, 1920.

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